quinta-feira | 17.07 | 11:06 AM

Vacina contra o vírus zika avança após testes bem-sucedidos em camundongos

Pesquisadores da USP relatam eficácia e segurança de imunizante baseado em partículas semelhantes ao vírus, próximos testes devem envolver humanos

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O desenvolvimento de uma vacina contra o vírus zika avançou mais uma fase importante. Pesquisadores do Instituto de Medicina Tropical (IMT), vinculado à Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), concluíram com sucesso os testes laboratoriais em camundongos, que demonstraram resultados promissores quanto à segurança e eficácia do imunizante.

Os experimentos foram realizados em camundongos geneticamente modificados, que são mais vulneráveis ao vírus zika. Os resultados indicaram que a vacina estimulou a produção de anticorpos capazes de neutralizar o vírus, impedindo a evolução da infecção e o surgimento de sintomas e lesões nos animais.

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Os cientistas também analisaram como o vírus se comporta em diferentes órgãos dos camundongos infectados, como rins, fígado, ovários, cérebro e testículos, tendo obtido resultados significativos principalmente nas duas últimas regiões, informa Agência Brasil.

A formulação utiliza uma tecnologia baseada em partículas semelhantes ao vírus (VLPs, na sigla em inglês), já adotada em vacinas como as da hepatite B e do HPV. Esse tipo de plataforma dispensa o uso de adjuvantes, substâncias que intensificam a resposta imunológica, o que pode representar uma vantagem na produção do imunizante.

A equipe de pesquisa também apostou em uma abordagem biotecnológica utilizando sistemas procarióticos, especificamente bactérias, que permitem uma produção em larga escala. No entanto, essa técnica exige cuidados adicionais com possíveis toxinas bacterianas. Essa mesma estratégia já havia sido aplicada pelo grupo no desenvolvimento de uma vacina contra a covid-19.

O projeto é liderado pelo médico Gustavo Cabral de Miranda, que entre 2014 e 2017 esteve na Universidade de Oxford e participou do desenvolvimento da plataforma tecnológica do Instituto Jenner. Foi desse grupo que surgiu a base da vacina da AstraZeneca, um dos primeiros imunizantes amplamente utilizados durante a pandemia de 2020.

“Lá estudamos o ChAdOx1 (um adenovírus de chimpanzé modificado em laboratório) para uso em doenças como malária, zika e chikungunya. Esse conhecimento acumulado possibilitou que, diante da pandemia, a tecnologia evoluísse rapidamente com o apoio de investimentos significativos”, afirmou Miranda em entrevista à Agência Brasil.

Segundo o pesquisador, a tecnologia das vacinas com VLPs é composta por duas partes principais: a partícula carreadora, que simula a presença do vírus para atrair a atenção do sistema imune, e o antígeno viral, que induz a produção de anticorpos específicos. No caso da vacina contra o zika, foi utilizado o antígeno EDIII, uma porção da proteína do envelope do vírus, responsável por se ligar aos receptores das células humanas.

O grupo agora busca financiamento para dar continuidade aos estudos em fases clínicas com seres humanos, o que exige um investimento de milhões de reais e envolve um processo demorado.

Enquanto isso, os pesquisadores exploram alternativas como vacinas baseadas em RNA mensageiro, além de estratégias de imunização heteróloga e homóloga. Até o momento, os recursos vieram da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

“Desenvolver uma vacina não é um processo simples. Construir uma planta, como chamamos, ou seja, uma fábrica de vacinas, requer adaptações e mudanças constantes. Hoje, as fábricas mais comuns são voltadas às vacinas tradicionais. Portanto, são essas que têm mais chances de avançar”, explicou Miranda.

Ele acrescenta que as tecnologias para produção de imunizantes têm evoluído e que fábricas capazes de operar com novas plataformas, como as adotadas durante a pandemia de covid-19, ampliam a capacidade de resposta diante de emergências sanitárias.

“Nosso objetivo principal é contribuir com o desenvolvimento tecnológico para que possamos produzir nossas próprias vacinas no Brasil. Seja agora ou daqui a uma década, o importante é manter a continuidade desse esforço seja no curto, médio ou longo prazo”, concluiu.

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