A necessidade de regulamentar o streaming no Brasil é amplamente defendida por profissionais do setor audiovisual. No entanto, há outra pauta considerada igualmente urgente: ampliar o acesso e incentivar a formação de público para o cinema nacional. Essa é a opinião do professor de cinema e audiovisual da Universidade Federal do Ceará (UFC), Marcelo Ikeda, que também atua como cineasta, curador e crítico de cinema.
Durante o seminário Cinema, Políticas e Mercado – A Distribuição do Filme Independente no Brasil, realizado no Festival de Cinema Sul-Americano de Bonito (Cinesur), em Mato Grosso do Sul, Ikeda lançou o que chamou de uma “provocação” ao público presente, incentivando a reflexão sobre o tema.
Segundo o professor, há uma legislação já existente voltada para isso: a Lei 13.006, sancionada em 2014, que determina a obrigatoriedade da exibição de filmes nacionais nas escolas de educação básica em todo o país. No entanto, essa legislação ainda carece de regulamentação.
“Fiz essa provocação porque, atualmente, o tema central no setor audiovisual é a regulação do streaming, o que de fato é essencial e urgente. É estratégico que as plataformas de streaming sejam reguladas pelo governo. Porém, considero tão importante quanto essa pauta a regulamentação da lei que prevê a exibição obrigatória do cinema brasileiro nas escolas. Acredito que essa dimensão da formação de público é fundamental”, afirmou Ikeda em entrevista à Agência Brasil.
Para ele, é essencial que crianças e adolescentes tenham acesso ao cinema nacional de forma ampla, começando pelas instituições de ensino.
“A escola é uma semente. É o espaço onde os jovens estão se desenvolvendo, tanto em termos de cidadania quanto de acesso à cultura. Trata-se de um ambiente essencial para a formação integral do indivíduo”, argumentou.
Ikeda explicou que regulamentar a lei permitiria criar estruturas adequadas dentro das escolas para viabilizar a exibição dos filmes. “É preciso uma regulamentação que torne a lei efetiva, que permita a instalação de estruturas físicas nas escolas como equipamentos adequados e também de uma base pedagógica”, ressaltou.
Ele defende que as escolas estejam preparadas para oferecer as condições necessárias ao aprendizado. “Não basta apenas exibir filmes brasileiros; é necessário que haja estrutura. As escolas precisam de projetores, acesso aos filmes e licenças de exibição, para que não haja violação de direitos autorais”, complementou.
Outro ponto destacado por Ikeda é a necessidade de preparar os professores para esse trabalho de formação.
“É essencial uma formação pedagógica para que professores ou cineclubistas possam não apenas exibir, mas também discutir os filmes. A formação de público vai além da simples exibição; ela envolve debate e troca de ideias”, explicou.Segundo Ikeda, esse projeto demandaria pouco investimento público. “É uma política de base. Não adianta investir apenas na construção de cinemas em shoppings. Isso também é relevante, mas para alcançar o público, é preciso começar pela base. E isso não requer grandes recursos financeiros, mas sim o trabalho de chegar às escolas e comunidades”, observou.
Ele também destacou o papel das conexões locais. “Não basta instalar um projetor e marcar uma sessão de cinema. É preciso haver um agente multiplicador local, alguém com vínculos com a comunidade, capaz de estabelecer conexões reais. A programação precisa dialogar com as demandas e o interesse desses públicos”, disse.
O Cinesur é um festival de cinema realizado na cidade turística de Bonito (MS) e segue até o dia 2 de agosto. Nesta edição, o evento exibe 63 filmes de nove países sul-americanos e promove debates, seminários e cursos de formação.
Todas as atividades do festival são gratuitas. Mais informações estão disponíveis no site oficial do evento.